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Avaliações de desempenho e promotabilidade

24/01/2024 por Alberto Pezeiro Dois dos processos mais importantes no desenvolvimento dos atuais e futuros líderes de uma organização são os processos de avaliação de desempenho e promoção de talentos (que eu tomarei a licença de chamar, neste artigo, de promotabilidade, um anglicismo para promotability).
Uma boa analogia para explicar esses processos é a condução de um veículo pelas ruas. O processo de avaliação de desempenho é como olhar pelos espelhos retrovisores do seu automóvel, para trás e com um horizonte limitado (por exemplo, durante um ano fiscal). Já o processo de promoção de talentos é como olhar através do para-brisa do seu automóvel, para frente, amplo e com visão do futuro (onde quero chegar nos próximos anos).
No primeiro artigo desta série sobre Formação de Lideranças, descrevi um modelo mental para a criação de programas de T&D que contemplem profissionais em todas as fases de suas carreiras. Já na segunda edição, abordei estratégias para a prospecção de novos líderes e criação de uma estrutura de sucessão que atenda às necessidades de longo prazo da companhia. 
Aqui, explorarei a importância dos processos de avaliação de desempenho e promotabilidade dos colaboradores como ferramentas para o desenvolvimento dos atuais e futuros líderes de uma organização.

 






















Avaliação de desempenho: um compromisso de desenvolvimento entre líderes e liderados

O processo de avaliação é um ciclo contínuo entre líder e liderado que dura todo o ano fiscal, mas que ganha intensidade e formalidade normalmente nos 2 últimos meses do respectivo ano (ou nos 2 meses iniciais no período seguinte).
Há diversas formas de se conduzir esse processo, mas, via de regra, os pontos avaliados são os seguintes:
•    Performance: capacidade de entregar as metas e objetivos acordados e lidar com as adversidades com protagonismo e responsabilidade;
•    Valores: imagem do profissional, da forma como ele entrega suas metas e objetivos alinhado aos valores, princípios e visão da organização;
•    Habilidades únicas: muito aplicado em organizações onde determinadas habilidades técnicas são necessárias e possui-las torna o profissional diferenciado;
Trata-se de um processo que demanda tempo e energia das duas partes envolvidas. Ao desenhar o processo e suas principais atividades a empresa deve buscar o equilíbrio entre ter um processo robusto, mas, ao mesmo tempo, enxuto e não-burocrático, de forma que todos possam dar o seu melhor ao realizá-lo (e não buscar atalhos ou formas de burlá-lo).
Ao longo do ciclo anual deve ser ajustada a frequência e formalidade das conversas de avaliação, procurando sempre focar na capacidade do profissional avaliado de entregar aquilo que a empresa está buscando naquele momento, ao mesmo tempo em que mantém o comportamento adequado aos valores da organização.
A escala de avaliação final pode ser ajustada da forma que cada organização julgar mais adequada. É bastante comum o uso de uma escala de 3 níveis:
•    Talento: profissional que se destacou nas dimensões avaliadas e merece atenção especial com relação à sua retenção e aproveitamento imediato em posições de maior responsabilidade;
•    Alto Valor: profissional que está realizando as suas entregas de forma adequada e para o qual se deve buscar desenvolvimento constante;
•    Menos eficiente: profissional que deve ser avisado, em uma conversa franca e transparente, sobre sua lacuna de desempenho e/ou valores e para o qual deve ser formalizado um plano de desenvolvimento e acompanhamento de curto prazo, de forma a torná-lo valioso para a organização. Esse acompanhamento deve ser feito de forma positiva, demonstrando que a organização acredita em seu potencial e, por essa razão, investe tempo e energia de forma a recuperá-lo, acreditando tratar-se de uma situação passageira e reversível.

Remuneração e bonificações baseadas em avaliação de desempenho

Muitas organizações baseiam uma parte da remuneração, aumentos e bonificações ao processo de avaliação do período anterior.
Trata-se de uma boa prática que depende bastante da cultura empresarial e da estratégia de “Salários e Benefícios” da organização.
Lembrando que, quanto mais agressiva for a estratégia de bonificações atreladas à performance, maior a probabilidade de se criar um ambiente competitivo na organização, tendendo a beneficiar os profissionais que se saíram melhor em suas avaliações em um determinado período, enquanto aqueles que tiveram uma avaliação de menor performance podem se sentir desestimulados a seguirem em frente como membros da organização. 
Tudo é uma questão de combinar a regra do jogo, ter transparência e treinar as pessoas envolvidas para que a condução do processo seja feita da forma mais correta e justa.

A famosa (ou famigerada) curva forçada

Durante um período de tempo houve um grande número de empresas que adotaram o princípio da “curva forçada”, que tornava mandatório que cada líder classificasse seus subordinados de acordo com uma % mínima de pessoas em cada categoria de avaliação.
Na GE, no final dos anos 90, quando estava à frente da governança desses processos na área corporativa da empresa na América Latina, adotávamos essa prática, que era bem entendida internamente, mas causava bastante ruído e má interpretação a quem olhava de fora. 
A ideia principal era forçar a liderança a identificar aqueles profissionais que, de fato, se destacavam e mereciam ser direcionados para treinamentos e oportunidades que o mantivessem em seu estado de desempenho diferenciado. Ao mesmo tempo que a forçava a identificar aqueles que não tiveram um bom desempenho e que se deveria investir tempo e energia para desenvolver.
O mito de que quem caía na faixa de “má performance” era demitido não era verdadeiro. A ideia era justamente avisar o mais cedo possível que essa pessoa não tinha tido uma boa performance e que a empresa iria investir na sua recuperação.
Por outro lado, numa situação de necessidade de diminuição da força de trabalho ou uma tendência de repetição de avaliações de baixa performance, tornavam esse profissional um “candidato natural” a ser desligado. A ideia era que essa pessoa nunca fosse pega de surpresa e, se o processo funcionasse bem, ela teria tempo e boa vontade da organização para se recuperar.

“No brilliant jerks“ (sem idiotas brilhantes) 

A frase acima é frequentemente atribuída ao CEO da Netflix, Reed Hastings. Trata-se de como lidar com aquelas pessoas que, constantemente, são vistas como capazes de entregar, e muitas vezes, superar constantemente as suas metas e objetivos, enquanto são o “contraexemplo” dos valores e princípios da organização.
É tentador fingir que não percebemos o comportamento errôneo dessas pessoas, uma vez que podem ser muito importantes para o desempenho do negócio, mas a grande verdade é que, quanto mais tempo mantemos essas pessoas, mais contaminamos o comportamento de outras.
É preciso ter coragem, e pensar no longo prazo, principalmente na cultura que queremos criar e perpetuar. Penso como o CEO da Netflix, nesse caso:
No brilliant jerks. Ou melhor, no jerks! Sem segunda chance!

Promotabilidade

A probabilidade de promoção de um profissional depende de uma série de fatores, alguns não controláveis por ele, como: número de oportunidades disponíveis, condições macroeconômicas, cultura empresarial desfavorável (por exemplo, promoções por tempo de empresa, que acabam desfavorecendo os mais jovens), entre outras possibilidades.
Por outro lado, muitas empresas dão grande ênfase a dois fatores principais quando pensam em promoção de um profissional:
•    Histórico da avaliação de desempenho e sua tendência ao longo dos anos. Um histórico de boas avaliações de desempenho seguidas ou uma reversão de desempenho ruim que vem se mantendo ajudam no aumento da promotabilidade de um profissional 
•    O profissional ser um exemplo do perfil de liderança esperado para a organização ao longo dos próximos anos. É o conceito de olhar através do para-brisa do automóvel.

Dentre os fatores sob o controle de um profissional que podem aumentar a sua Promotabilidade, há 3 elementos-chave, representados pelo acrônimo PIE (acrônimo bastante utilizado nos treinamentos de Liderança da GE):


 






















Performance: capacidade de execução, protagonismo, habilidade de implementar transformações organizacionais junto às suas responsabilidades de curto prazo e compromisso com as decisões tomadas pela empresa;
Imagem: é a sua marca pessoal, ou seja, a visão que passa às demais pessoas na organização. É ser original e natural, não parecer um personagem corporativo. É ter inteligência emocional, influenciar pela admiração e ser visto como um bom facilitador;
Exposição: é se fazer ser conhecido (e reconhecido) por todas as áreas da organização, contribuir para projetos multi-departamentais, participando de treinamentos e eventos corporativos e representando de forma adequada a organização quando na presença de agentes externos (clientes, fornecedores, imprensa);
O profissional pode trabalhar ao longo do tempo com seu líder (ou um mentor) para identificar as lacunas e se desenvolver para ter um PIE equilibrado.

E o mais importante: desenvolver a noção de que o maior responsável pelo desenvolvimento da sua carreira é você. Não se colocar em papel de vítima e/ou responsabilizar a empresa, o RH, seu superior imediato ou qualquer outro agente externo pelo seu amadurecimento profissional. Você é o resultado das (boas e más) decisões tomadas ao longo da sua carreira. 
Concentre-se em mudar aquilo que tem controle e não se deixe afetar por aquilo sobre o que não pode fazer nada.
O papel do RH e do T&D

As áreas de recursos humanos e treinamento e desenvolvimento devem atuar para: 
•    Tornar os processos mais robustos e menos burocráticos. 
•    Trazer ferramentas que facilitem a vida dos gestores no processo de avaliação de desempenho e Promotabilidade
•    Garantir a boa governança desses processos e ferramentas 
•    Fazer o ajuste fino das avaliações e participar das discussões de promoção 
•    Garantir que exista uma aderência das avaliações e promoções aos “assuntos quentes do momento”
•    Digitalização e simplificação do processo para minimizar o tempo dispendido pelos líderes para a execução das avaliações.

Conclusão e o papel dos atuais líderes

O papel do RH na Governança dos processos e ferramentas é fundamental, mas o grande segredo para o sucesso de uma iniciativa de avaliação de desempenho e de promotabilidade é o engajamento dos atuais líderes, bem como o seu envolvimento em todas as etapas do processo.
Na GE, no final dos anos 90, o processo de avaliação e promotabilidade era denominado internamente de Session C. Era a espinha dorsal da máquina de formação de líderes da organização.
A partir do processo, que era contínuo e ocorria em todos os níveis da organização:
•    Definíamos quais treinamentos de Universidade Corporativa traríamos naquele ano para a organização e, com base na avaliação de desempenho dos negócios, quem seriam as pessoas que iriam participar dos mesmos 
•    Utilizávamos o Programa Seis Sigma para fazer um “piloto de Liderança” com as pessoas que estavam a ponto de serem promovidas, mas precisavam ser testadas em atividades de Transformação Organizacional;
•    Definíamos parte da remuneração variável e aumentos salariais;
•    Estabelecíamos quais eram as pessoas que precisavam de melhorar a performance e que iriam passar pelo Programa de Desenvolvimento Individual (PDI);
Em todos esses processos havia o envolvimento e participação de toda a alta liderança. Participar do processo Session C era fundamental para os líderes da organização mostrarem alinhamento com um dos grandes valores corporativos que tínhamos – o desenvolvimento dos atuais e futuros líderes. 
Destacar-se nesse quesito era um grande acelerador de carreiras. Não era incomum pessoas, como o ex-CEO da GE, Jack Welch, dizerem que chegavam a gastar 50% do seu tempo e energia ao longo do ano trabalhando no desenvolvimento das pessoas.
 
AUTOR: Alberto Pezeiro CEO & Founder - SETA DG CEO e fundador da Seta Desenvolvimento Gerencial, Ex-executivo de RH, Gestão, Vendas e Manufatura da GE, FORD e VW. Foi professor de MBA e Pós Graduação na Fundação Vanzolini ( Poli – USP ). Tem grande paixão por ensinar. Vem dedicando os últimos 20 anos a ajudar as pessoas a se desenvolverem e, consequentemente, ajudar as organizações a terem resultados e performance melhores.
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